terça-feira, junho 01, 2004

terceiro mundo

Último dia do mês. Como que um calvário no Carvalhido. Cenário terceiro-mundista.
Dirijo-me a um posto dos CTT (hoje transformados numa espécie de lojas de cidadão de bairro).
Atravessando a praça, avisto logo a fila que de dentro se estendia até ao exterior, chegando a
confundir-se com a fila mais pequena, das pessoas que esperavam o autocarro.
A dita fila, ou a maldita bicha se quiserem, devia ter uns bons 50 metros.
Que povo este que espera sempre o último dia do mês, para pagar tudo e mais alguma coisa!?
Uma multitude de analfabetos, concretos ou funcionais, iletrados de toda a espécie, lamuriosos reformados ou queixosas domésticas, e os desprevenidos
do costume. Como eu.
Gente aflita, de recibos e facturas na mão, com medo dos “mitras” e dos “penetras” que se fazem
de lorpas e fazem de conta que não viram bicha nenhuma, gente ansiosa que não sabe pagar as contas da
tv cabo, da água, da luz, ou do gás de outra forma, mísera gente que tem de esperar sempre pelo derradeiro
dia do mês para poder comprar o “passe” ou liquidar qualquer uma dessas dívidas implacáveis.
Reformados a quem o dinheiro nunca chega nem nunca sobrará. Sempre achei um milagre como conseguem
sobreviver.
No meio disto tudo, um ou outro negro de um país improvável, gorro exótico na cabeça,
esperando autorização para telefonar, balbuciando palavras insanas.
Para ajudar a toda esta festa, os nossos carteiros nunca se dignam bater à porta ou a tocar à campainha. É
bem mais fácil deixar um avisozinho a dizer que “não atendeu”. E lá vamos nós, então, engrossar a fila dos desesperados,
depois de gastar gasolina ou a sola dos sapatos e de, sobretudo, desperdiçar o mais precioso dos
bens nos dias de hoje, o tempo, esse gajo mesmo.



FC